segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

Braços Curtos

Todos nós sabemos que existe gente pobre, gente órfã, gente doente, gente abandonada, gente que sofre de tudo quanto é jeito... e aprendemos desde cedo a “conviver” com essa realidade. Ela se torna parte do nosso dia a dia e na maioria do tempo simplesmente sabemos que está lá, existe, mas não sentimos.


E então, de repente, você se aproxima de uma realidade dessas. Conhece. Convive. Sente. E dói. Dói porque você vê que, diferente do que era antes, não dá pra simplesmente conviver com a ideia de que uma realidade dessas existe e está tudo bem. Você quer fazer algo, quer ajudar, quer mudar tudo aquilo. Você faz o que pode, ajuda aqui e ali, se esforça. Quanto mais você faz, menos parece fazer, porque a realidade continua ali e você sabe que mais deveria ser feito. Mas seus braços são curtos e não dá para abraçar o mundo. E então vem a dor da impotência, quando você percebe o quão pouco consegue fazer para mudar a realidade na qual se envolveu. E essa dor se transforma em culpa. Culpa por não fazer mais, quando deveria fazer mais. Você se questiona como pessoa, questiona sua força e disposição, questiona a si mesmo de tal forma que acaba se diminuindo, porque o pouco que consegue fazer nunca será o suficiente. Você sofre, sofre mesmo, mas sabe que não pode (e nem quer) fugir daquilo. É parte de você agora. 


O mundo nos faz acreditar que certas situações são usuais, comuns, acabam acontecendo com algumas pessoas, e está tudo certo ser assim, é normal. Mas não é. Entre de cabeça em um problema social, conviva, aprenda, descubra como se sentem as pessoas e vai saber do que estou falando. A alienação é um poço de felicidade porque nos deixa conviver com tudo sem nos importarmos. Mas basta sentir, um pouco que seja, e não esquecer que aquilo está ali diariamente, para que você nunca mais ignore.  E mesmo que faça algo, não estará satisfeito, nunca mais. Ainda que isso traga sofrimento, talvez seja bom que aconteça assim, afinal, a insatisfação, ainda que doa, ainda que machuque, que faça sofrer, que faça sentir-se impotente, pode se tornar o combustível da ação. É uma batalha interna, para a qual nem sempre estamos prontos. Eu não estava, mas como tudo na vida, vou ter que aprender a lidar.