domingo, 29 de janeiro de 2012

Grandes Livros: A Arma Escarlate

O ano é 1997. Em meio a um intenso tiroteio, durante uma das épocas mais sangrentas da favela Santa Marta, no Rio de Janeiro, um menino de 13 anos descobre que é bruxo. Jurado de morte pelos chefes do tráfico, Hugo foge com apenas um objetivo em mente: aprender magia o suficiente para voltar e enfrentar o bandido que está ameaçando sua família. Neste processo de aprendizado, no entanto, ele pode acabar por descobrir o quanto de bandido há dentro dele mesmo.


Bom, eu havia lido algumas coisas sobre o livro na comunidade do orkut de Harry Potter. Eu pensava comigo mesmo: Puxa, um livro sobre uma escola de magia no Brasil? Deve ser legal.


Mas fui adiando a compra do livro... deixando para depois... Até que um certo dia, por algum motivo obscuro, tive muita vontade de lê-lo, e finalmente encomendei minha cópia na Saraiva.


O que eu esperava? Uma história no mínimo inocente sobre um garoto que descobre que é bruxo, e passa a ter o objetivo de aprender magia e se livrar da perseguição dos traficantes, já que estava jurado de morte. O básico da resenha.


Mas o que descobri, o que li, foi incrível.


Em primeiro lugar, a escritora, Renata Ventura, fez a lição de casa. Utilizou acontecimentos reais na Favela Dona Marta para nos introduzir aos personagens. O tempo todo são citados fatos que realmente aconteceram no mundo real, o que nos torna próximos à história. Um delicioso aperitivo, claro.

Mas o que mais surpreende são os personagens. Primeiro os professores, retratos exatos dos vários tipos diferentes no Brasil. Temos o professor inconsequente, o faltoso, a queridinha da turma que não ensina direito, a muito inteligente mas terrivelmente insensível, o ótimo professor cuja matéria ninguém se interessa... Estereótipos saudáveis com os quais convivo diariamente como professor nas escolas em que leciono.
E os alunos, longe de serem perfeitinhos, são os típicos alunos das escolas brasileiras, muito bem retratados até mesmo nos modos de falar.

E tem o protagonista, Hugo, o mais humano de todos. Um personagem ambíguo, real, que erra várias vezes, fatalmente até, alguém que nunca, nunca mesmo eu imaginava ser protagonista de um livro desse tipo. Em vários momentos da leitura, me peguei pensando "puxa, Hugo deveria ser algum tipo de vilão da história, e não o personagem principal", para só depois descobrir que as circunstâncias que o fazem agir de maneira impulsiva talvez fizessem com que eu agisse da mesma forma. É assustador como Hugo me fez pensar sobre consequências, meios e fins, o quanto nós poderíamos ser parecidos, o quanto de bandido eu teria dentro de mim, como diz a sinopse. Se ao ler Harry Potter e a Ordem da Fênix você se espantou com o comportamento rebelde e impulsivo de Harry, prepare-se para se espantar, e muito, com o comportamento de Hugo que, diga-se de passagem, tem muitos motivos para se revoltar contra a vida. 

Toda história de fantasia e aventura tem um grande vilão, e A Arma Escarlate não foge à regra. Contudo, o vilão, o grande mal que acaba assolando a escola, nada tem a ver com bruxos psicopatas ou mentes malignas, mas sim algo extremamente próximo à nós, muito difícil de se vencer e muito, mas muito mais perigoso que um Voldemort da vida. Grande sacada da autora, uma das melhores do livro.

E méritos também à valorização de nossa cultura, uma vez que os feitiços vem de línguas indígenas e africanas, nosso folclore e cultura são amplamente valorizados e até mesmo críticas à nossa mania de copiar o estrangeiro surgem nas páginas de maneira suave. Vemos traços do folclore e de nossas tradições explicados dentro do mundo mágico desenvolvido pela autora.

E são deliciosas as referências à saga Harry Potter. Nada gritante, saborosamente sutis, que os fãs da série captam no ato. Algumas são mais gostosas de perceber que as outras, criando uma conexão interessante, e diga-se de passagem, sugestiva, com a saga de J.K. Rowling.

Fica aqui a recomendação de leitura e um ENORME PARABÉNS para Renata Ventura, por criar uma história tão densa e ao mesmo tempo tão divertida e prazerosa, que me fez repetir um feito só antes alcançado por Harry Potter: A leitura de um livro de 500 páginas em dois dias, o que me rendeu algumas olheiras, claro. E um grande gostinho de "quero mais". Bem mais.


sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

A imagem resume muita coisa.

Eu com Terezinha Guerra e... OH WAIT!!!

Braço elástico? O.O

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Tempo


          
Salvador Dali. Soft Watch at the Moment of First Explosion, 1954.


           É doloroso observar o tempo. Quando você realmente dedica um pouco de atenção a ele, enxerga-o como uma força destrutiva, em cuja presença tudo se corrói e desaparece.
Essa observação tem consequências, pois você vê seu mundo desmoronar e se reconstruir, em um ciclo muitas vezes doloroso, onde suas lembranças nada mais são que escombros empilhados sobre os anos passados.
          Quando somos crianças, o tempo ainda é um mistério. Parece-nos que sempre teremos a mesma idade, que nossos pais são adultos desde sempre, que as coisas estão como sempre foram e que nada mudará em nossas vidas. Tudo é “sempre” para uma criança.
          Mas você começa perceber o tempo quando as pessoas ao seu redor começam a morrer. Uma avó, uma tia, um amigo, uma a uma as pessoas vão nos deixando sem que possamos fazer absolutamente nada. É quando a ilusão infantil de que as coisas são eternas desaparece, o momento em que somos forçados a acordar para a verdade de que as pessoas que amamos não são imortais, e que um dia provavelmente acabaremos sozinhos.
          E conforme a vida segue vamos descobrindo ainda que o momento em que vivemos, por melhor ou pior que seja, não é eterno. Pessoas vão embora, talvez você se mude, talvez alguém muito importante morra, talvez troque de emprego. O fato é que descobrimos que a vida é formada por ciclos e fases que vivemos, compostas por tudo e todos que nos rodeiam. E que nada é eterno.
           Fases às quais nunca damos o devido valor. Quantas vezes nos pegamos saudosos do tempo de escola, enquanto naquela época não víamos a hora de terminar os estudos? Quantas vezes temos saudades da pessoa querida que se foi, enquanto recusamos seus inúmeros convites de jantar enquanto vivia? O sábio ato de enxergar esses pormenores do tempo e de nossa mente confusa só nos são proporcionados quando realmente procuramos enxergar o tempo.
            E nada é mais efêmero em nossas vidas do que as pessoas. É curioso como amamos pessoas furiosamente, sejam amigos, familiares ou amantes, com a impressão de que jamais poderemos suportar uma separação. Pessoas importantes, amizades que dizemos ser para toda a vida, mas que não resistem a alguns meses de separação, quando nem mesmo temos palavras ou assunto para uma simples conversa em um reencontro desconfortável.
            Ando observando o tempo nos detalhes da vida. Um antiga e famosa loja de sapatos, hoje é uma farmácia. Um terreno baldio, no qual tanto brinquei, está abarrotado de casas. Pastos e montes de terra se converteram em asfalto e blocos de cimento. Pessoas que amei me deixaram. Fases da vida que tanto desvalorizei, hoje me lembro com saudade e carinho. E principalmente, observo temeroso o futuro. Pela primeira vez na minha vida, dou valor para o meu viver presente. Amo as coisas que faço, meu trabalho, minha situação atual, mas principalmente, as pessoas que fazem parte da minha vida. E sei que, como todas as outras, essa fase também vai terminar. Talvez, por observar o tempo, estou me preparando para o fim de tudo isso e o início de outra fase da vida. Talvez, essa fase já esteja começando, e esse texto seja só para tentar admitir esse fato.  De qualquer forma, desde agora, já sinto falta desses últimos anos que vivi, pois com toda a certeza foram os melhores da minha vida.
             Quando tudo isto acabar, quando outro momento se iniciar para mim, espero sinceramente ser capaz de abandonar esses anos e seguir em frente, desejoso de que as pessoas que fazem parte do meu mundo estejam sempre comigo, de uma forma ou de outra. Para que talvez, eu possa deixar de observar o passar do tempo como uma coisa tão destrutiva, mas sim como alicerce para uma nova vida.


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